Quando eu era criança, queria ser adulta. Ficava imaginando como seria legal ter dinheiro pra comprar o que eu quisesse (que sonho!), ter um carro (e dirigir), ter a minha casa e decidir como ela funcionaria e qual seria o cardápio do jantar, ter liberdade para ficar até de madrugada acordada, sozinha ou entre amigos, abrir a caixa de correspondência e jogar fora o que não me interessasse, usar salto do tamanho que eu tivesse vontade, enfim, mandar na minha própria vida. Eu só não contava que seria impossível aproveitar cada uma dessas coisas sem passar pelas agruras da vida: as decepções amorosas, as dificuldades financeiras, os pequenos impasses do dia a dia (o pneu que fura, a lâmpada que queima, a pasta de dente que acaba) e os grandes impasses, as perdas, os sonhos não realizados, as oportunidades não aproveitadas, os traumas, os tombos... Ufa!
Quando eu era criança, parecia fácil
e divertido ser adulto. Que bom seria se desse para aproveitar as “recompensas” da
vida adulta com a inocência infantil. O problema é que para aproveitar essas “recompensas”,
carregamos uma carga imensa de responsabilidade. E, pior, com o tempo, nós nos
tornamos pessoas mais duras, menos românticas, mal queremos dar bom dia ao
vizinho. O dia a dia cansa. O trabalho exaustivo, as contas a pagar, os
problemas familiares, o pneu que fura ... Muitas vezes, é difícil achar uma
coisa bonita no cotidiano. Nem percebemos que uma borboleta pousou na janela e
foi embora. Vamos perdendo a visão de quão interessante e bela pode ser a vida.
Medo de arriscar, de se apaixonar, de confiar, de compartilhar, de viver. Temos
medo. Ou cautela. Pra mim, dá no mesmo.
O fato é que criança não tem medo
nem cautela. Criança vive. Adulto, como eu costumo dizer, é chato. Quantas vezes
você não se pegou pensando naquele super problema no meio do filme, no cinema? Aí o outro, no final, comenta sobre uma das
cenas e você nem sabe do que ele está falando. Parece que assistiram a filmes
diferentes. Tem dia que é difícil. A gente tem insônia, acorda de mau humor, não
quer se apaixonar, nem tomar banho de chuva, discute com o chefe, leva o filho
pra emergência por causa de uma dor de garganta. E ainda tem que arrumar tempo
pra viver? Missão quase impossível! Veja bem: quase! Porque o problema não é
tempo. É o olhar. O carro, a casa, os
amigos que ficam até de madrugada foram conquistados (e isso é bom!). Mas, mais
do que isso: a borboleta ainda é tão colorida quanto antigamente, se apaixonar
ainda pode dar frio na barriga e, muitas vezes, trocar a chatice de escolher o
cardápio do jantar por uma pizza com refrigerante pode ser muito divertido!